Passou a eleição e, como se previa (mesmo que muitos jurem de mãos postas que não), as relações entre os que estão e não querem sair, os que não estão e querem entrar – porque assim foi combinado ou porque se acreditam merecedores devido a um esforço e outro durante a campanha ou porque perderam disputas e não tem para onde ir – não é , e nem poderia ser, as melhores.
Dessa forma, na mesa de decisão misturam-se currículos, bilhetinhos, códigos cifrados, intrigas, tramas, invejas. Enfim, tem sempre algo de podre em qualquer reino.
Por falar em reino, assisti à chamada promocional de lançamento do filme “As viagens de Gulliver”, estrelado pelo Jack Black e com estréia prevista para o Natal. Por coincidência, leio a história de Lemuel Gulliver e suas “ viagens em diversos países remotos do mundo” contada por Jonathan Swift. É uma edição de 1952, da Editora Globo, com tradução de Octávio Mendes Cajado e estudo introdutivo de Eugênio Gomes.
Em sua terceira viagem, a Laputa, Balnibarbi, Glubbdubdrib, Luggnagg e ao Japão, Lemuel visita a “Grande Academia de Lagado”, capital de Balnibardi. Passeia por várias salas ocupadas por “projetistas “ que desenvolvem diversos experimentos que deverão, algum dia, servir para alguma coisa. Até que chega à “escola dos projetistas políticos”. Assim, relata Gulliver a sua impressão: “Na escola dos projetistas políticos passei um mau bocado; parecendo os professores, na minha opinião, haver perdido o juízo; espetáculo que me deixa melancólico. Essa infeliz gente propunha planos para persuadir os monarcas a escolherem os seus validos em atenção à sabedoria, à capacidade e à virtude deles; para ensinar os ministros a consultarem o bem público;(…)escolhendo para os diversos cargos pessoas qualificadas para o exercerem;além de muitas outras quimeras fantásticas e impossíveis, cuja concepção nunca passaria pela cabeça de ninguém(…)”.
Entre essas “quimeras fantásticas” , conta Lemuel que “outro professor me mostrou um longo escrito em que se continham instruções para o descobrimento de tramas e conspirações contra o governo. Aconselhava aos grandes estadistas que examinassem a dieta de todas as pessoas suspeitas; as suas horas de comer, o lado sobre o qual se deitavam na cama; a mão com que limpavam a bunda; que lhes estudassem acuradamente os excrementos, de cuja cor, cheio, gosto, consistência, fase digestiva, poderiam deduzir-lhes os pensamentos e desígnios. Porque os homens nunca se mostram mais sérios, reflexivos e compenetrados do que sentados na privada, o que ele próprio verificara depois de reiterados experimentos; pois nessas circunstâncias, quando costumava, apenas por experiência, meditar na melhor maneira de assassinar o rei, as fezes lhe saíam esverdeadas, mas muito diferentes quando só pensava em organizar uma sedição ou por fogo na metrópole”.