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quinta-feira, 1 de novembro de 2012

AMORES




Diz a letra da música que alguém sabe que vai amar a outra por toda a sua vida. Existem amores que serão eternos enquanto durar os amantes. E amantes eternamente amados durante a vigência do amor. Amar é perigoso e arriscado mas é o melhor lactobacilo ‘vivo’ do corpo e da alma.

Tem amores urgentes, tão urgentes que nem se percebe o parceiro, nem os parceiros se encontram. Você sacode a embalagem tetrapack  e consome tudo em até três dias para não perder a validade.

Há os amores burocráticos, agendados com dias de antecedência e com uma ritualística mais para reunião de acionistas do que para uma cama com lençol de linho. Algo assim “vamos ao que interessa pois tenho muita coisa para fazer”. De pois de ‘amar’ , risca-se a atividade ou escreve-se ‘ok’ na agenda.

Amor de lesma é outro tipo. Muita contorção, esforço para se descobrir que avançou pouco. Melhor , que é tão sinuoso que desgasta, consome a energia de modo a cansar os moluscos gastrópodes ao final de uma jornada.

Os amores comuns, aqueles de declarações afetuosas, do ombro amigo, da cumplicidade, da mão na mão, dos passeios no final da tarde, do sono de ‘conchinha’, do café da manhã com fruta e música e olhos inchados de uma felicidade em andamento, de risos, de dormir até mais tarde, ah, estes amores parecem caricatura em tempos de “vai ser bom, não foi”?

Todas as vezes que eu vejo aquelas ‘mocinhas de gesso’ debruçadas nas janelas ou nas varandas, escorando o ‘rosto’ com as mãos, eu me pergunto quantos corações de gesso circulam pelas ruas loucos por voltar às suas ‘janelas’ e ‘ varandas’ e continuar assistindo a vida passar.

A vida que vai passando por entre as mãos que não se tocam, por entre os olhos que não se olham, por entre as bocas que não se encontram, pelas palavras que não ditas, pela esperança que não se confessa, pelo sonho que não se sonha.

Com certeza, isto não quer dizer amor.

O CÉU



O menino apanha a folha de papel em branco.Coloca sobre a mesa junto com a sua caixa de lápis coloridos. Escora a cabeça com a mão esquerda, encosta o lápis de cor azul nos lábios e pensa.

- Tá pensando?

A criança pensa em desenhar um lindo céu azul. Só o céu.

- Não tem uns passarinhos?

Não, não tem passarinhos. Os passarinhos estão num outro céu que ele desenhou outro dia.

- Céu não precisa de nuvens para a gente saber que é céu?

Céu, cada um tem o seu dentro do peito. Com nuvens ou sem elas.Nuvens são as estopas que os anjos usam para limpar as sujeiras do céu da gente. Tem céu que está tão sujo que é preciso lavar. Daí que a chuva é a água das estopas espremidas lá em cima.

- E você vai desenhar um céu desse tamanho?

O tamanho do céu do pequeno desenhista não cabe numa folha de papel.É maior que o tamanho do céu que seus olhinhos podem medir. Naquela folha vai desenhar só um pedacinho. Um pedacinho do céu, se a gente deixa entrar na nossa vida, é muito melhor que qualquer remédio.Tem paz,tem esperança,tem sonho.Deitar, então, num pedacinho desse azul derramado, deixa a pessoa molezinha e toda suspiros.

- Esse céu que você vai desenhar tem um motivo especial?

Motivo? É preciso que tudo tenha um motivo, que tudo seja explicável, explicado? Que as coisas só valem se as apresentarmos aos outros como, sei lá, um plano de uso, um manual de instruções e com um abaixo-assinado com milhões de assinaturas aprovando o que estamos ou vamos fazer?

- O que tem dentro dessa cabecinha que deixa você tão pensativo?

Ah, tem tanto,tanto de desejos,angústias,expectativas, sonhos, perguntas esperando respostas e respostas esperando perguntas.

- Não vai me contar ?

O menino rapidamente põe na folha de papel o céu pedaço de azul. Diz que está pronto. E responde que desenhou aquilo por causa do amor. Para que o amor dele  possa ir e vir naquele pedaço de céu.

- Amor?! Meu Deus, mas você é muito romântico, é um poeta!

Pronto, enquadraram o artista.

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