Powered By Blogger

terça-feira, 4 de setembro de 2012

NOSSOS SENTIMENTOS



No conto “ O gato preto” , de Edgar Allan Poe, num certo momento o narrador  diz: “(…)E, então, como para perder-me final e irremissivelmente, surgiu o espírito da perversidade. Desse espírito, a filosofia não toma conhecimento. Não obstante, tão certo como existe a minha alma, creio que a perversidade é um dos impulsos primitivos do coração humano – uma das faculdades, ou sentimentos primários, que dirigem o caráter do homem. Quem não se viu, centenas de vezes, a cometer ações vis ou estúpidas, pela única razão de que sabia que nãodevia cometê-las? Acaso não sentimos uma inclinação constante, mesmo quando estamos no melhor do nosso juízo, para violar aquilo que é lei , simplesmente porque a compreendemos como tal?(…)O vivo e insondável desejo da alma de atormentar-se a si mesma , de violentar sua própria natureza, de fazer o mal pelo próprio mal, foi o que me levou a continuar e, afinal, a levar a cabo o suplício que infligira…(…)”.

Sem a pretensão de contrariar o narrador, recordo das ideias de Aristóteles sobre  energeia e dynamis .A primeira é o “ato”, diz respeito ao estado natural do ser, seu existir aqui e agora. A segunda, a “potência”, sinaliza o que esse ser pode ser sem deixar de sê-lo. Bernardette Siqueira Abrão, em “História da Filosofia”(Ed.Nova Cultural) exemplifica: “ A semente de uma árvore, enquanto ato, é semente, mas como potência é a árvore que dela vai germinar. As mudanças e o movimento são o modo como as potencialidades do ser vão se atualizando, passando da potência ao ato”.

Aonde eu quero chegar com isto! Aqui mesmo, onde estamos todos. Neste território ínfimo que transita aí pelo Universo. Nesta arena para a qual somos conduzidos ou nos conduzimos(por bem ou à força) e na qual vamos experienciando as mudanças de ato em potência em ato em potência, ad infinitum .
Perversidade quer dizer maldade, malignidade, ruindade. É o mesmo que barbaridade, atrocidade, crueldade, improbidade, truculência. É fazer doer no outro, consciente da proporção dessa dor. Só no outro?

A perversidade não está apenas na atitude insana e complexa. Está num simples não ou sim. Ao ser utilizada contra alguém já terá sido também eficaz contra quem a usa. E quando se toma um gostinho pela coisa…

Nos assustamos com os acontecimentos bárbaros que todo dia ouvimos ou vemos ou lemos. Não conseguimos, num instante de reflexão, compreendermos como somos capazes de cometer tamanhos desatinos. Mas nos esquecemos de que ao nosso lado uma pessoa esperava o nosso incentivo e nós fomos indiferentes ou o negamos. Quantos sonhos nós desmanchamos, quantos desejos nós proibimos , quantos gritos de liberdade nós calamos, quantas iniquidades nós incentivamos?

Daí que “o homem está condenado a ser livre”. Condenado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Arquivo do blog