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sábado, 31 de outubro de 2009

MEU BRUXO

TRICKS OR TREATS


Rose Marie Muraro na introdução histórica ao livro Malleus Maleficarum, escrito em 1484 pelos inquisidores Heinrich Kramer e James Sprenger, cita outra escritora, Marilyn French que, no seu livro Beyond Power, estima em cem mil o número de mulheres queimadas vivas pela Inquisição. “As bruxas” , na ótica da infalibilidade divina a partir da interpretação do magistério terrestre composto pelo papa e seus bispos.

31 de outubro é o Dia das Bruxas. Diz a história que tal celebração ocorreu pela primeira vez há dois mil anos. Afirmar que Jesus foi também um bruxo é heresia. Portanto, não digo. Faça-o você, desde que não haja um religioso ao seu lado.

Os celtas é que inventaram a celebração. Eles ocuparam um território que compreendia desde a Turquia central até as ilhas britânicas, me informa o Houaiss. Celtas são os hoje irlandeses, escoceses e ingleses. A festa, antroponomizada de Samhain, era em razão do fim do verão, do início do Ano Novo e da fartura agrícola. Popularmente, foi chamada de “o dia das almas”, uma vez que eles acreditavam que na noite de 31 de outubro o mundo espiritual se encontrava com o material. A sacanagem fica por conta deles acreditarem que as almas eram de membros superiores da igreja católica e que eram inofensivas.

Bruxarias a parte, a folia venceu os séculos e os irlandeses a trouxeram para os Estados Unidos no século 19, agora registrada como Halloween. Não é que o negócio pegou e tornou-se festa tradicional infantil no latifúndio do brother Obama. Lá a meninada se fantasia e pede doce de casa em casa.

Aqui no Brasil de Lula, as crianças pedem comida e esperança de porta em porta. Salvo as do Chico que, na falta de arroz e futuro, descobriram que comer luz é muito mais romântico que qualquer cardápio macrobiótico ou natureba.

Lá na terra do Tio Sam, onde só o Noam Chomsky descobriu o que ele quer, a molecada gasta U$ 2,5 milhões em máscaras, figurino e presentes. Até o presente momento não se tem informação sobre a possível queima de uma feiticeira.

Bruxos e bruxas, na minha infância, só a que tentou matar a Branca de Neve, ou a que fez dormir a Gata Borralheira, a Maga Patológica, a Madame Min, o Merlin Mais tarde, foi a vez da Elizabeth Montgomery ,sua filha Tabata, e a mãe-avó Endora.

Não sei se a menina , na minha frente, atarefada com uma pesquisa escolar sobre o tema, sabe quem foi a Elizabeth. Bruxas perderam o encanto e o mistério. Caíram no descrédito fílmico e telenovelístico. Menino e adulto atualmente têm medo é do próximo.

Com a tal da globalização, não é que as escolas brasileiras importaram a baboseira para suas grades curriculares. Coisa de pedagogo e educador mais preocupados com a publicação no diário oficial de suas férias-prêmio ou quinquênio.

Generalização ou não, a verdade está na minha frente – e dos meus óculos pouco eficazes e carentes de lentes mais agressivas.

A menina não sabe nada de celtas, de almas e de inquisições. Suas bruxas e bruxos de agora sãoGandalf, Saruman, duas criaturas da fantasia imperiosa de J.R.R.Tolkien. Estes, verdadeiros bons da boca. Bruxos da primeira hora. Para completar o álbum moderno de bruxaria, a menina cola na folha de papel almaço uma fotografia do Harry Potter. Lá se foi o tempo da Cuca e da Circe.

Circe, a feiticeira, personagem da Odisséia do poeta Homero, não se deu bem ao esperar Ulisses e seus marinheiros. A danada ia transformá-los em animais e depois servi-los num banquete. Ela já havia transformado em porcos metade da tripulação quando Hermes resolveu ajudar o guerreiro grego, enganando a coitada. Hermes me lembra um camarada apaixonado pela mesma pessoa que eu. Para evitar digressões, vou me referir a ele de acordo com a versão romana: Mercúrio.

Meu bruxo tem palavras repletas de feitiço. “O primeiro amor passou/o segundo amor passou/o terceiro amor passou/Mas o coração continua”. Nasceu em Itabira, num 31 de outubro de 1902. Passou pelo colégio jesuíta de Nova Fribugo, no Rio. Ganhou vários concursos literários. Dos religiosos, a expulsão e a exigência de retratar-se pelas obras publicadas no jornal da cidade. “Insubordinação mental”, arbitraram os magistrados à luz inicial do século 20.

“Vai, Carlos! ser um gauche na vida”, disse-lhe um anjo torto escondido nas sombras. “É guaché, moço”, corrige a menina.

Traduzido em 13 idiomas, o bruxo do meu tempo enfeitiçou a Suécia mas não impressionou a professora da ingênua candidata a adulto, neste momento absorta no bordar do título da pesquisa.

Murilo Melo Filho afirma que “sem nenhum amor pela vida rural, aluno do grupo escolar da cidade, o jovem Drummond já era, então, magricela e alto, amante das boas e desorganizadas leituras: Antero, Rimbaud, Pascal, Bergson, Anatole, Ibsen e Wilde”.

Contudo, quem é o Andrade para enfrentar abóboras, teias, cisos, morcegos e caldeirões ?
Menor que o porco de Circe, “o homem magro, de andar titubeante e quase cadenciado”, na leitura de Melo Filho, não tem poderes suficientes para sensibilizar a mestra da criança que fala halloween e não sabe as poções da magia poética de um mago de cento e sete anos.

Cento e sete anos! O que são cento e sete anos para uma escola onde a sensibilidade ainda não saiu da pré-história e, portanto, não entende o vate: “Diante deste relógio/ no nevoeiro londrino/recorda-te, ao ver a hora/ que és meu tempo e meu destino”.

Travessuras ou gostosuras, as quero do meu bruxo poeta.







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