Vez ou outra, me chega um pedido para ler um texto de outrem, ajustar um parágrafo, revisar uma epístola comercial, esboçar uma matéria jornalística, seja ela sobre economia,filosofia,unha encravada,administração de recursos humanos(agora tratados como talentos humanos, colaboradores, parceiros e por aí vão).
Trato especificamente da matéria jornalística e da responsabilidade do jornalista com a redação do texto. Em tempos em que se discute a necessidade do diploma para o exercício da profissão de jornalista( se pensarmos que tantas vezes fomos curados de um mal qualquer apenas com um chazinho, uma benzeção ou um dedo na garganta, seria correto afirmar que não é preciso cursar uma faculdade de medicina para exercer a profissão de médico)eis que no segmento empresarial, aqui inclusas micro,pequenas,médias e grandes organizações surgem, todos os dias, peças de comunicação, principalmente as conhecidas como “nosso jornalzinho interno”, “nosso veículo de comunicação com o mercado” , “a revista da empresa” , “ nosso instrumento de venda institucional” , “ nossa ferramenta da responsabilidade social” . Com eles, afloram as mais “impressionantes estruturas de produção e redação” que, à guisa do exemplo das benzedeiras e rezadeiras (com todo o respeito a estas), se arvoram em jornalistas e “assumem” a responsabilidade editorial dos impressos.
Vez por outra – com o perdão pela repetição – jornalistas diplomados e com experiência no exercício da profissão são contratados para “profissionalizarem” as publicações. Contudo, esses veículos de comunicação empresarial , sejam impressos, radiofônicos, televisivos, intranet ou “telepáticos”, por se tratarem de peças criadas pelos SAC – Serviço de Atendimento ao Cliente(ou ao consumidor), ou pelas áreas de RH(Recursos Humanos), Marketing, Comercial, entre outras menos citadas, acabam se transformando em “propriedades” desses setores. E o pior é que, do chefe,gerente,supervisor,superintendente até o auxiliar administrativo, a secretária, a telefonista e mais outros tantos, conforme o organograma funcional, todo mundo assume a função de “jornalista”.
Assim, o jornalista mesmo – que, muita das vezes (adoro isso) foi contratado pela agência de propaganda que detém a conta da empresa e foi demandada a “fazer” o jornal e/ou a revista – se depara com situações do tipo:
.Ninguém é capaz de dizer qual o perfil do leitor;
.Não existe um “manual” de redação;
.Ninguém sabe o que é uma pauta(quer dizer, tem gente que pergunta se é o mesmo que caderno pautado, “aquelas linhazinhas, sabe?”);
.A agência, ou o intermediador entre o jornalista e a empresa, omite-se aos dois primeiros itens e em todos , a seguir;
.O grande chefe pede um texto com palavras difíceis, de alto nível. O texto vai, pára na mão do sub-chefe que “acha” que o texto está complicado demais, que precisa ser escrito de modo mais inteligível. O texto “mais inteligível não é “entendido” pela secretária do sub-chefe que o devolve afirmando que o sub-chefe não pode levar para o grande chefe um texto “assim”. Esse “assim” ninguém, NINGUÉM MESMO, na empresa, sabe explicar;
.O RH quer tomar posse do jornal ou da revista que, segundo sua história, é criação e está sob a jurisdição do SAC e tenta “envolver” o jornalista na tramóia;
.O SAC, por sua vez, “avisa” ao jornalista que o RH quer dar o golpe e que se isso acontecer, será por culpa dele. Do SAC? Claro que não, meu caro Watson! Dele, o jornalista;
.O Marketing “disputa” com o Comercial a primazia do puxassaquismo no propósito de tomarem para si a responsabilidade do impresso;
.A “alta gerência” manda em tudo. E tudo e todos têm medo da “ alta gerência” . A coisa é tão feia que tem gente em cargo bem lá no rodapé da estrutura que, se achando o ronco do batmóvel, também quer mandar e desmandar na edição;
.A falsidade nas relações profissionais entre os “jornalistas da empresa”, a agência ou intermediador e o JORNALISTA é tanta que até o Paraguai se acanha;
.Tem mais: com a tal “profissionalização”, muitos “jornalistas de liquidação” são excluídos do processo. Instaura-se uma picuinha, o tal de "um não gosta de outro", do outro que se vinga no jornalista, dificultando o seu trabalho. Há situações em que a secretária da gerência redigia as matérias referentes ao setor. Ao ser substituída pelo jornalista, continua com a responsabilidade – delegada por seu superior – de avaliar o que foi escrito. Kafka, cadê você?!;
Quem sofre e saí perdendo é só o jornalista(DIPLOMADO E COM EXPERIÊNCIA).
Aí, aquele dedão que você enfiava na garganta, para vomitar...