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quinta-feira, 26 de abril de 2012

O OUTRO


O OUTRO 

Não devemos obrigar as pessoas a adotarem um modelo, um padrão de vida e de comportamento pessoal e profissional. Não somos donos da verdade para afirmarmos que “isto é melhor para você”.

Destino, sorte, objetivo, estrada, fé cada um tem o seu ou adquire durante a vida. Ou não. O máximo que podemos fazer é contribuir para a felicidade alheia ( estando nós também felizes). Se não for assim com você, por favor agradeço sua contribuição mas vou ser feliz a minha maneira.

O Odair José canta que “felicidade não existe, o que existe são momentos felizes”. Quanto mais momentos, então, mais felicidade. Deixar o outro falar, poder falar ao outro, dividir perspectivas, buscar e encontrar respostas e soluções, ser livre e ver sua liberdade respeitada são itens nessa lista odairiana de “momentos felizes”.

Claro, a gente quer o melhor para os que estão mais pertos de nós. E, espero, mesmo que em menor proporção, para os não tão próximos também. Mas a melhor proximidade talvez seja a demarcação da distância entre a nossa vida e a vida alheia. Dessa forma temos uma chance de aprender a hora de ofertar a mão, de acelerar o passo ou de acenar para aquele que , num determinado momento, com a nossa cooperação, escolheu outra estrada e outros viajantes para dividir a aventura.

sábado, 21 de abril de 2012

KANE


KANE *

Orson Welles foi um cidadão disposto ao risco e talentoso para enfrentá-lo. Talvez até arrogante por causa de sua transbordante criatividade. Contudo, pagou caro por isso.

Desde a transmissão de uma adaptação de “A guerra dos mundos” de H.G.Wells, em outubro de 1938, pela rádio Columbia Broadcasting System , que provocou pânico entre os ouvintes( http://www.classicosdaradio.com/WarWorld_inicio.htm ), Welles apostou em uma linguagem mais agressiva, inconformada para o texto, a interpretação e a narrativa cinematográfica. Daí, a sua grande obra, “Cidadão Kane” cuja pré-estreia aconteceu em Nova York em 1º. de Maio de 1941.

É uma aula de interpretação, direção, roteiro, fotografia e exemplo da potencialidade do cinema – e dele – em contar histórias. Orson consegue utilizar quase que à exaustão recursos já comuns ao cinema como flashbacks, câmera baixa, entre outros. A questão é que esse uso se faz com uma qualidade e dramaticidade impressionantes.

Como a história se aproximava muito da história real de um magnata das comunicações, William Randolph Hearst, o filme teve dificuldades de toda ordem, principalmente de divulgação, devido às pressões de Hearst. Como o contrato de Welles com a RKO não permitia que a empresa alterasse o filme, o filme não pode ser modificado pelo poder econômico do magnata.Mas , dizem os conspiradores de plantão, Orson passou a ter problemas com todas as suas produções seguintes.

“Cidadão Kane”, independente de ser considerado um dos “melhores filmes de todos os tempos” – existem listas que o incluem entre os dez mais importantes – é um filme sobre poder,dinheiro e solidão. Os moderninhos podem classificá-lo de “retrô”. Os lúcidos, de soco no estômago.

A ilustração está em www. alana.org.br

segunda-feira, 16 de abril de 2012

POR FALAR NISTO

POR FALAR NISTO 

Que toda a ruptura reúna;
Que toda a sutura aproxime;
Que toda a lágrima alimente;
Que toda a discórdia dissolva;
Que todo o sorriso resolva;
Que cada aceno confirme;
Que um sim compreenda o não;
Que todos os olhares sejam cúmplices;
Que o calendário seja chamado paixão;
Que as horas palpitem;
Que os relógios contem as vontades;
Que a tua mão encontre o amparo;
Que as nossas preces não pereçam;
Que todos os idiomas tornem-se um só diálogo;
Que a poesia seja tão importante quanto a matemática;
Que somar seja sinônimo de repartir;
Que tua palavra seja o pão;
Que o coração seja o suprimento;
Que todo dicionário se traduza na palavra;
Que a palavra seja atitude;
E que todo ato seja de amor.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

O CONQUISTADOR


Tarde de sábado. Ônibus atravessando a cidade. Entra um casal. Ela vem na frente, escolhe sentar na cadeira atrás da minha. Ele vem depois. Camisa preta de manga comprida, air bag proeminente abrindo frestas entre os botões. Cabelos grisalhos, pele queimada de sol.

Ela conversa alguma coisa ao celular, confirma um encontro com uma pessoa no centro da cidade. E lá vai o “ônibus pela estrada em baixo do céu” como canta Caetano.

Aí o diálogo do casal salta para questões pessoais. O homem insiste num relacionamento, a mulher diz que não está preparada, acabou de sair de um. Pelo jeito não foi uma relação inesquecível. Ele quer saber se ela não gosta dele, não está a fim. A donzela esquiva daqui, encolhe dali, jura que não é isso e insiste no despreparo para um novo namoro assim, digamos, de repente. Quer arranjar um emprego logo, voltar a trabalhar.

Então as regras começam a ser delineadas. O grisalho e barrigudo afirma que se ela ficar com ele não tem esse negócio de trabalhar fora. Com ele, lugar de mulher é dentro de casa. A coitada não retruca.
Silêncio curto, o parceiro pula para a linha debaixo e divide o bate-papo de alcova com todos os passageiros. Já que é transporte coletivo, vamos coletivizar a conversação. Quer saber se ela não quer viver com ele. A mulher responde que ele é gente boa. Mas para um relacionamento sério…

Truco! O cidadão explica que ela não pode afirmar nada a respeito dele. “Você diz que gosta de uma fruta sem experimentar?” A senhora ao meu lado me olha. A sensação é de que temos a mesma opinião. Só que o conquistador não está disposto a ouvir nossos pontos de vista . Insiste que sem experimentar não se pode opinar.

A dama não se dispõe a experimentar a tal fruta que lhe é oferecida – talvez lembrando aquela célebre história da maçã – e cair na arapuca feito sanhaço novo. Magoado pela recusa do acepipe amoroso, o homem entende que o melhor será terminar um namoro que mal começou. A companheira desconversa, comenta o tamanho da rodoviária, pergunta se a cidade tem aeroporto – ele responde que são dois não sei se pensando no da Pampulha e no do Carlos Prates ou excluindo o segundo e se referindo a Confins – , confessa que acha bonito a decolagem e o pouso das aeronaves, inquire se ele gosta de ver aviões
Ponto de descida se aproximando e ele, antes dela, desce das nuvens e conclui que é melhor, então, os dois se despedirem antes de descer. Pelo reflexo do vidro – me desculpem a indiscrição – assisto o don juan tentar beijar a virgem do lotação. Esta , em nome dos bons costumes e do amor verdadeiro – aquele da chama que acende a vida da gente – se nega a ceder os lábios, ou o rosto, ou o queixo ou o pescoço ao ávido apaixonado. Este acaba beijando o ombro da mulher que, por falta de mais espaço, não teve como recolher.

Depois fica tudo por conta da tarde.

sábado, 7 de abril de 2012

ATIRE A PRIMEIRA PEDRA


Ético é aquele que , através de suas atitudes, propicia o bem do próximo, da comunidade, do mundo para não perder o romance. Me preocupa muito os juízes de plantão, os mestres do templo, os doutores da lei, os arautos do politicamente correto que aproveitam dos erros de outrem para lançar mão de sentenças apocalípticas e mandar todo mundo para a fogueira.

Primeiro, somos todos bárbaros, completamente doidos ou quase. Segundo, os códigos e leis não dão conta das nossas “modernas” condutas. Terceiro , as forças reguladoras, fiscalizadoras e repressoras são cada vez mais frágeis: o crime, o ilegal, o jeitinho, o “sabem quem sou eu” , o primeiro eu e o segundo também minam por completo a base legal de suas ações. Na melhor das hipóteses, essas forças são omissas.

É aquela história: defendo o aborto desde que não seja na minha (e sua) família, desde que não seja a minha(e sua) filha; aposto que uma criança em situação de risco pode ser protegida se acolhida em um lar estruturado desde que não seja no meu (no seu); é um absurdo a falta de higiene de logradouros públicos mas o meu(e o seu) cachorro podem defecar onde bem entenderem; participo de campanhas pela vida e quase gozo(você também) quando um marginal é espancado ou morto( e se ele matou alguém, a gente acha pouco o castigo que ele recebeu); a gente se assusta com o avanço das drogas, em especial o crack, mas dá uns “tapinhas”, uns “tecos” por aí em nome do descolado, do antenado, do conectado; a gente apóia, pela internet,  todas as solicitações de adesão à alguma causa(desde o perdão de um oposicionista no Afeganistão até a cirurgia para colocação de prótese num cão atropelado mas quase morre de raiva quando o vizinho do lado bate à nossa porta pedindo ajuda.

Não só personalidades e servidores públicos devem dar o exemplo. Aliás, no caso dessas duas categorias, o comportamento e o caráter éticos devem estar implícitos. Nós, também precisamos repensar nosso comportamento. Metemos o pau nos políticos mas não fugimos de uma possibilidade de aproximação, abraço, cumprimento e fotografia. Com um pouco mais de intimidade, pedimos um favor ou oferecemos nossos préstimos. E, cúmulo da falsidade,  juramos que votamos nele. Com as personalidades, pedimos autógrafos e lembrancinhas (os menos afoitos dizem que é para o filho, o neto, a esposa, um amigo, a namorada),tiramos fotos e nos esquecemos das críticas e comentários desabonadores que fizemos sobre elas.

Ótimo quando a lei é aplicada. Contudo, toda vez que a histeria surge como orgasmo dessa aplicação, o punido vira exceção, a falta se transforma em deslize. E o tempo passa, o tempo voa mas a hipocrisia persiste numa boa.

terça-feira, 3 de abril de 2012

RINGUE


Nada pior do que acumular mágoas, ressentimentos, insatisfações. Chega um dia e a casa cai.

Se na vida pessoal e particular esse tipo de ocorrência é sempre desgastante, no ambiente profissional me parece ainda pior. As pessoas se relacionam e vão colecionando insatisfações de toda ordem com a desculpa de que precisam trabalhar, precisam do emprego, o salário não é ruim (salário bom só o é no dia em que dizemos quanto queremos ganhar e o contratador aceita), não querem pedir demissão e perder os direitos. A  lista é grande.

Acontece que seja durante uma reunião, seja durante uma conversa de trabalho – ou até mesmo na mesa de um bar, entre uma cerveja e outra (para os que praticam este tipo de terapia) se perde a estribeira e o tsunami verbal não tem barreira. Destrói tudo.

Não acredito nessa conversa de que “somos um time”. Mas também não voto a favor de que “isso aqui é uma casa de mãe Joana”. Prefiro a exposição clara – e em tempo real – das divergências e contrariedades. E as respectivas soluções.

Protelar atitudes ou armazenar sofrimentos e decepções não contribuem  para nada. Salvo se a empresa pretende diversificar e entrar no negócio de luta livre.

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