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quinta-feira, 12 de abril de 2012

O CONQUISTADOR


Tarde de sábado. Ônibus atravessando a cidade. Entra um casal. Ela vem na frente, escolhe sentar na cadeira atrás da minha. Ele vem depois. Camisa preta de manga comprida, air bag proeminente abrindo frestas entre os botões. Cabelos grisalhos, pele queimada de sol.

Ela conversa alguma coisa ao celular, confirma um encontro com uma pessoa no centro da cidade. E lá vai o “ônibus pela estrada em baixo do céu” como canta Caetano.

Aí o diálogo do casal salta para questões pessoais. O homem insiste num relacionamento, a mulher diz que não está preparada, acabou de sair de um. Pelo jeito não foi uma relação inesquecível. Ele quer saber se ela não gosta dele, não está a fim. A donzela esquiva daqui, encolhe dali, jura que não é isso e insiste no despreparo para um novo namoro assim, digamos, de repente. Quer arranjar um emprego logo, voltar a trabalhar.

Então as regras começam a ser delineadas. O grisalho e barrigudo afirma que se ela ficar com ele não tem esse negócio de trabalhar fora. Com ele, lugar de mulher é dentro de casa. A coitada não retruca.
Silêncio curto, o parceiro pula para a linha debaixo e divide o bate-papo de alcova com todos os passageiros. Já que é transporte coletivo, vamos coletivizar a conversação. Quer saber se ela não quer viver com ele. A mulher responde que ele é gente boa. Mas para um relacionamento sério…

Truco! O cidadão explica que ela não pode afirmar nada a respeito dele. “Você diz que gosta de uma fruta sem experimentar?” A senhora ao meu lado me olha. A sensação é de que temos a mesma opinião. Só que o conquistador não está disposto a ouvir nossos pontos de vista . Insiste que sem experimentar não se pode opinar.

A dama não se dispõe a experimentar a tal fruta que lhe é oferecida – talvez lembrando aquela célebre história da maçã – e cair na arapuca feito sanhaço novo. Magoado pela recusa do acepipe amoroso, o homem entende que o melhor será terminar um namoro que mal começou. A companheira desconversa, comenta o tamanho da rodoviária, pergunta se a cidade tem aeroporto – ele responde que são dois não sei se pensando no da Pampulha e no do Carlos Prates ou excluindo o segundo e se referindo a Confins – , confessa que acha bonito a decolagem e o pouso das aeronaves, inquire se ele gosta de ver aviões
Ponto de descida se aproximando e ele, antes dela, desce das nuvens e conclui que é melhor, então, os dois se despedirem antes de descer. Pelo reflexo do vidro – me desculpem a indiscrição – assisto o don juan tentar beijar a virgem do lotação. Esta , em nome dos bons costumes e do amor verdadeiro – aquele da chama que acende a vida da gente – se nega a ceder os lábios, ou o rosto, ou o queixo ou o pescoço ao ávido apaixonado. Este acaba beijando o ombro da mulher que, por falta de mais espaço, não teve como recolher.

Depois fica tudo por conta da tarde.

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